quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Arqueólogos e dinossauros? Paleontólogos e múmias? Você está errado!

Por Márcia Jamille
É extremamente comum a confusão entre o trabalho de arqueólogos e paleontólogos, embora sejam disciplinas que apesar de estudarem o passado possuem objetos de estudo impares. O equivoco maior é acreditar que profissionais da Arqueologia trabalham na busca e análise dos remanescentes de dinossauros, o que nem de longe é verdade, uma vez que este é o trabalho da Paleontologia. No texto a seguir vocês poderão conferir os aspectos gerais das pesquisas paleontológicas e entenderão em qual momento estas disciplinas podem acabar se encontrando.

O que é Paleontologia?

Malcolm McKenna na Mongólia em meados do século XX.
Paleontologia (do grego palaios, “antigo” + ontos, “ser”, de “seres vivos” + logos, “estudo”) é a ciência natural que analisa animais e vegetais através dos seus remanescentes fósseis, para assim entender o passado geológico do nosso planeta. Seus estudos abrangem varias perguntas que buscam ser respondidas através da observação das estruturas morfológicas externas e internas de antigos organismos e as marcas de suas atividades, como pegadas e até mesmo urina — Clique aqui e saiba mais “Urólito: Xixi de Dinossauro – Marcelo Fernandes” —. Ela envolve conhecimentos advindos da Biologia, Geociências, Física, Matemática e Química, que unidas auxiliam na compreensão dos eventos que possibilitaram as mudanças ambientais no correr da história do planeta, mas tem em suma a sua base na Biologia e na Geologia  (CARVALHO, 2004). Já a Arqueologia (do grego arqueo, “antigo” + logos, “estudo”), assim como a Paleontologia tem como seu principal enfoque o estudo do passado, contudo a distinção entre ambas está no seguinte principio básico:
☥ Paleontologia: ciência que estuda animais e vegetais fósseis.
☥ Arqueologia: ciência que estuda a cultura material e imaterial.
Ou seja, a Arqueologia trata do passado da perspectiva humana, no entanto, tudo anterior ao aparecimento dos primeiros hominídeos faz parte exclusivamente da enseada da Paleontologia, cuja a importância não está somente em entender essa história mais pretérita. Com o seu estudo podemos compreender mais sobre as plantas e animais atuais, inclusive os próprios humanos, a exemplo da sua linha evolutiva (CARVALHO, 2004).
Escavação de um dinossauro herbívoro na província de Yunnan, China, em 1987.
Mas dentre os objetivos principais da Paleontologia estão:
☥ Analisar a biodiversidade que já existiu;
☥ Reconstituir o ambiente do passado;
☥ Definir uma cronologia para a idade da Terra através dos estratos geológicos (datações relativas, ou seja, gerais, não oferecendo um ano especifico como é o caso das datações absolutas);
☥ Fornecer dados para o entendimento da evolução biológica;
☥ Pontuar locais com reservas de hidrocarboneto, depósitos minerais, etc;
Infelizmente ambas essas disciplinas costumam ser confundidas com hobby, um simples passa-tempo, mas ao contrário do que o senso comum tende a pensar elas se utilizam de metodologias de campo para exercer seus trabalhos, contam com debates teóricos e as coletas de seus objetos de estudo devem ser realizadas somente por profissionais treinados em uma ambiente acadêmico devidamente reconhecido. É importante salientar que a posse ou venda de remanescentes paleontológicos e arqueológicos é crime.

Um poco da história da Paleontologia

Antes do surgimento desta ciência, no mundo ocidental o único conhecimento que se tinha do passado era aquele apresentado pela literatura clássica (grega e romana) e pela Bíblia, principalmente a partir da Idade Média, quando o conhecimento científico foi monopolizado pela Igreja Católica. Graças a isso se acreditava que o mundo teve uma origem sobrenatural e que além de ser mais recente do que é realmente — usando como parâmetro os anos apresentados pela Bíblia — teria um fim iminente, que seria causado pelo retorno de Cristo (SLOTKIN, 1965 apud TRIGGER, 2004).
Escavação na Patagônia revelando ossos de um Saurolophus.
Entretanto, com as descobertas ocasionais não somente de grandes ossos (que mais tarde desvendou-se como remanescentes da megafauna — mamíferos de grandes proporções — e de dinossauros), como também de ferramentas feitas em pedra [1] (as quais, até se descobrir que foram feitas por mãos humanas, eram rodeadas por interpretações sobrenaturais [2]), dúvidas sobre esse passado antes ensinado começaram a surgir.
Fotografia registrada durante uma expedição norte-americana na Mongólia em meados do século XX.
Contudo, em 1669, um pesquisador chamado Nicolau Steno (1638-1686), após comparar fósseis com conchas de moluscos modernas notou suas semelhanças, o que o levou a perceber que tais fósseis eram remanescentes de animais viventes em uma época muito antiga e não de pedras comuns. Com a chegada do século XVIII, cientistas começaram a sugerir muito mais abertamente, mas não livre de represálias, que o mundo era muito mais antigo do que os clérigos apontavam. Vemos surgir então figuras como o geólogo francês George Cuvier (1769 – 1832), um dos pais da Paleontologia científica, que reconstruiu esqueletos de fósseis quadrupedes que até então eram desconhecidos e através dos estratos geológicos conseguiu demonstrar para a comunidade científica a antiguidade destes espécimes e as sucessões de extinções (TRIGGER, 2004).

Paleontologia mais a Arqueologia:

Foi nesse período que uma Arqueologia mais primaveril começou a casar com a Paleontologia. Com uma visão mais questionadora sobre o passado, os remanescentes humanos ou artefatos em contexto com os ossos desses grandes quadrupedes desconhecidos começaram a abrir uma nova página para o entendimento da história do planeta, onde foi visto que em algumas regiões do mundo seres humanos conviveram com tais animais, hoje chamados de megafauna, caçando-os e sendo caçados [3].
Dentre estes animais temos registrados mamutes, rinocerontes peludos, tigres-de-dente-de-sabre, preguiças-gigante, antas, tatus-gigantes, palaeolama, grandes equinos, etc. No Brasil temos espécimes de megafauna, mas ainda não foram encontradas ocorrências convincentes de convivência humana com tais animais.
Osso de preguiça-gigante brasileira. Foto: Márcia Sandrine. 2015.
Esta coexistência foi apresentada não pela primeira vez, mas de forma oficial no livro The Geological Evidences of the Antiquity of Man (As evidências geológicas da antiguidade do homem), de Charles Lyell, em 1863, quatro anos depois da publicação do livro The origin of species by means of natural selection (Traduzido nas versões brasileiras como “A Origem das espécies”), de Charles Darwin, que explicando de forma simplista sugere que espécies evoluíram através de uma “seleção natural” e que os humanos e macacos possuem uma herança símia em comum (NEVES; PILÓ; 2008). Ambas estas obras tiveram muito impacto no desenvolvimento da Arqueologia paleolítica, interessada em entender o passado mais recuado da humanidade.

Em uma escala temporal

Para que vocês tenham uma ideia do quão é antiga a vida na terra e onde podemos encaixar a Arqueologia, separei o próximo parágrafo em duas cores: laranja para Paleontologia e roxo para Arqueologia:
Um dos animais mais antigos conhecidos a caminhar em terra seca foi o Tiktaalik, antes dele outras formas de vida —  as bactérias —  já existiam há cerca de 3,5 bilhões de anos, mas todas eram exclusivamente aquáticas. As primeiras plantas terrestres surgiram há 500 milhões de anos. Os dinossauros e primeiros mamíferos surgiram há 225 milhões de anos e por mais de 100 milhões de anos caminharam pela Terra, até serem extinguidos por um asteroide que caiu no nosso planeta há 66 ou 65 milhões de anos, deixando somente outros tipos de criaturas, a exemplo de pequenos mamíferos. Ao contrário do que alguns podem chegar a considerar, a vida humana não surgiu ligeiramente após a extinção dos dinossauros, ainda foi necessário muito tempo até que os primeiros hominídeos (antepassados de nós humanos modernos) surgissem há 7 milhões e meio de anos e ainda outros para que o Homo erectus caminhasse, há 1,8 milhões de anos e nesse meio tempo nossos antepassados irem desenvolvendo culturas e deixando sua história em ferramentas feitas em pedra e em registros rupestres há cerca de 30 mil anos e a domesticar tanto plantas como animais há cerca de 10 mil, para somente desenvolver a escrita há cerca de 8 mil (TRIGGER, 2004; NEVES; PILÓ; 2008).
Os termos que definem essas disciplinas são simples, mas caso ainda tenham dúvidas, ou tenham ficado mais curiosos, abaixo compartilho um vídeo que gravei em um Laboratório de Paleontologia, onde elaboramos uma mescla entre uma entrevista com um passeio guiado pelo o acervo paleontológico para mostrar as diferenças entre os trabalhos de ambas as áreas.

Visitando um Laboratório de Paleontologia:

No dia 14/07 visitei o Laboratório de Paleontologia do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde — Departamento de Biologia da Universidade Federal de Sergipe onde gravei uma entrevista em vídeo com o Prof. Drº Alexandre Liparini Campos. Além da entrevista caminhamos pelo acervo acompanhados por Paulo Ricardo Lima Aragão, aluno PIBIC/COPES-UFS.
A ideia deste vídeo é mostrar as diferenças entre os trabalhos de Arqueologia e de Paleontologia.
Esta entrevista foi muito esclarecedora para mim e foi divertido aprender mais sobre fósseis, conhecimento que compartilho agora com vocês. Estou escrevendo um post também para o #AEgípcia, onde contarei detalhes de como foi a minha visita. Quando estiver pronto o anexarei aqui.

Onde estudar Paleontologia no Brasil?

Para quem está curioso, não existe no Brasil graduação em Paleontologia, mas existe a Pós-graduação (Mestrado e Doutorado), então o comum é o aluno sair da Geologia ou Biologia. Este é um quadro parecido com o da Arqueologia há uns sete anos atrás, quando não existia as graduações e onde a solução era o interessado sair da História (que é uma disciplina impar da Arqueologia, tendo uma das poucas coisas em comum o estudo do passado) ou mesmo de outras áreas que realmente não tinham nada a ver como literatura, jornalismo, advocacia, administração, etc.

Referências bibliográficas:
CARVALHO, Ismar de Souza (Ed). Paleontologia. Volume 1. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2004.
NEVES, Walter Alves; PILÓ, Luís Beethoven. O povo de Luzia: em busca dos primeiros americanos. São Paulo: Editora Globo, 2008.
TRIGGER, Bruce. História do Pensamento Arqueológico. São Paulo: Odysseus, 2004.
Museu de curiosidades #3 – Megafauna. Disponível em < https://saemuseunacional.wordpress.com/2013/04/05/museu-de-curiosidades-3/>. Acesso em 06 de agosto de 2015.
Site: 
Sociedade de Paleontologia Brasileirahttp://www.sbpbrasil.org/
Nele é possível ler artigos científicos, lista de algumas das Universidades onde é possível estudar Paleontologia no Brasil e links interessantes relacionados com a disciplina.
Colecionadores de Ossos: www.scienceblogs.com.br/colecionadores
Este é um blog que reúne várias notícias sobre descobertas paleontológicas e vídeos que mostram aspectos da profissão de paleontólogo.

[1] Até o século XVII acreditava-se que tais ferramentas feitas em pedra fossem fósseis, que por sua vez se imaginava que possuía origem inorgânica.
[2] Ainda hoje entre alguns indivíduos mais crédulos estas pedras possuem uma origem mística, como um dos seus nomes sugerirem: “pedra de raio”.

[3] Mas não podemos esquecer-nos da Zooarqueologia, ramificação que trabalha exclusivamente com os remanescentes faunísticos encontrados em contexto com os sítios arqueológicos e que também pode ser aplicada a este período.
___________________
Arqueóloga formada pela UFS com a monografia “Egito Submerso: a Arqueologia Marítima Egípcia” e mestra em Arqueologia também pela UFS com a pesquisa “Arqueologia de Ambientes Aquáticos no Egito: uma proposta de pesquisa das sociedades dos oásis do Período Faraônico”. É administradora do Arqueologia Egípcia.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Ditadura brasileira planejou invadir Uruguai caso esquerda ganhasse eleições de 1971

Por Rodrigo Martins 


Informação está em telegrama datado de 24 de agosto daquele ano do então embaixador norte-americano no Brasil, William Manning Rountree, parte de lote de 538 documentos secretos dos anos 1970 desclassificados pelos EUA
Sob o monitoramento dos Estados Unidos, a ditadura brasileira planejou invadir o Uruguai caso a coalizão de esquerda Frente Ampla saísse vitoriosa das eleições de 1971. Em telegrama datado de 24 de agosto daquele ano, o embaixador norte-americano no Brasil, William Manning Rountree, informou às autoridades de seu país que os militares não iriam tolerar um governo socialista tão próximo da fronteira. “Se a Frente assumir o poder, o governo brasileiro consideraria de forma relevante uma intervenção militar direta, incluindo uma demonstração pública de poderio bélico.”
A correspondência integra um lote de 538 documentos secretos dos anos 70 que tiveram o sigilo desclassificado total ou parcialmente pelo governo de Barack Obama, em decorrência da recente visita de Dilma Rousseff aos EUA. A maioria dos papéis foi produzida pelo Departamento de Estado, especialmente pelas embaixadas e consulados no Brasil. São telegramas, memorandos e relatórios. O acervo revela que os norte-americanos estavam muito bem informados sobre as mortes e graves violações aos direitos humanos nos porões da ditadura, mas optaram por esconder os pecados de seu principal aliado na luta contra os movimentos de esquerda no continente.
Menos de um mês após o desaparecimento de Rubens Paiva, Washington foi informada de que o ex-deputado não havia resistido ao interrogatório dos agentes da repressão. Temia-se que o episódio viesse a público e comprometesse a imagem do presidente Richard Nixon, aliado do regime brasileiro. Da mesma forma, os Estados Unidos souberam que Virgílio Gomes da Silva, mentor do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969, morreu sob a custódia do Estado. E jamais acreditaram na versão oficial sobre o atentado no Riocentro, tramado pelos próprios militares.
[Emílio Garrastazu Médici e Richard Nixon durante visita do brasileiro aos Estados Unidos em 1971]
No caso do Uruguai, o telegrama de Rountree lança luzes sobre um episódio tratado por muitos anos como teoria conspiratória. Desde 1964, o país era observado com muita atenção pelos militares nativos. Além da posição geográfica estratégica na região platina, o vizinho abrigava grande número de exilados, entre eles, o ex-presidente João Goulart e o ex-governador gaúcho Leonel Brizola, observa Ananda Simões Fernandes, do Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul. A historiadora sustenta que o plano de intervenção emergiu logo após a formação da Frente Ampla, em 1971. Para o governo dos EUA e a ditadura brasileira, havia o temor de a esquerda conquistar o poder, a exemplo do ocorrido no Chile dois anos antes, com a vitória da Unidade Popular, de Salvador Allende.
“O Brasil arquitetou um plano de invasão a Montevidéu, que ficou conhecido, nos meios militares, como Operação Trinta Horas. Tal plano seria executado em caso de vitória da Frente Ampla nas urnas”, afirma a pesquisadora. O jornalista Paulo Schilling, assessor e braço direito de Brizola, foi o primeiro a denunciar a trama, ainda no início dos anos 1970, nas páginas do semanário uruguaio Marcha. Desacreditado por sua militância de esquerda, Schilling viu suas denúncias serem corroboradas em meados dos anos 1980 pelo coronel brasileiro Dickson Grael, oficial que apoiou o golpe de 1964, mas, desiludido com os rumos da ditadura, registrou em livro um detalhado depoimento sobre o episódio.
Segundo Grael, a Operação Trinta Horas foi montada no III Exército. À época, o coronel era oficial do Estado-Maior do Quartel-General da 2ª Divisão de Cavalaria, sediada em Uruguaiana, fronteira com a Argentina. Novas declarações vieram a público em janeiro de 2007, quando, em um programa de tevê gaúcho, o general Ruy de Paula Couto, ex-chefe do III Exército, afirmou ter sido o então presidente uruguaio Jorge Pacheco Areco quem solicitou apoio das tropas brasileiras. A coalização de esquerda saiu derrotada da disputa presidencial, mas elegeu cinco senadores, 18 deputados e 51 vereadores. Com o golpe de 1973 no Uruguai, a intervenção foi definitivamente descartada.
“A Frente Ampla se espelhava na Unidade Popular do Chile, com forte discurso anti-imperialista. À época, Allende era a principal ameaça aos EUA no continente, pois chegou ao poder pelo voto, desmistificando a tese de que o socialismo era incompatível com a democracia”, avalia a historiadora Fernandes. “O Brasil insere-se, nesse contexto, como o principal aliado da administração Nixon na América do Sul. Não por acaso, a ditadura brasileira participou ativamente do golpe na Bolívia em 1971 e financiou grupos extrema-direita no Chile para derrubar Allende. Esse telegrama revelado agora mostra como o Brasil exerceu ingerência sobre o Uruguai.”
No informe, Rountree observa um esfriamento das relações entre Brasil e Uruguai por causa do fracasso nas negociações pela libertação do cônsul brasileiro Aloysio Gomide, sequestrado pelos tupamaros em 1970. O diplomata só seria libertado após sete meses de cativeiro, mediante pagamento de resgate pela família. Embora considerasse improvável uma intervenção direta no Uruguai, o diplomata pondera que o Brasil poderia patrocinar um golpe preventivo de Pacheco. “A ajuda provavelmente se daria na forma de armas, treinamento, assistência financeira etc.”
Sobre o desaparecimento de Rubens Paiva, um memorando, datado de 11 de fevereiro de 1971 e assinado pelo diplomata John W. Mowinckel, é taxativo: “Paiva morreu durante o interrogatório, de ataque cardíaco ou de outras causas”. No texto, ele pede ao embaixador para “convencer” o governo brasileiro a “punir ao menos alguns desses responsáveis”. Embora destacasse o episódio como mais um exemplo das táticas “irresponsáveis” da ditadura, Mowinckel parecia mais preocupado com a repercussão do crime nos Estados Unidos. “Quando os fatos vierem à tona, não será possível varrê-los para debaixo do tapete”, observa. “Os pecados do governo brasileiro respingarão sobre nós, causando assim mais um problema no Parlamento e na imprensa para a administração Nixon.
Luiz Antônio Dias, chefe do Departamento de História da PUC de São Paulo, observa que o documento foi produzido menos de um mês após a prisão e o desaparecimento de Paiva. À época, o Exército divulgou a versão de que ele havia sido resgatado por um grupo de terroristas durante sua transferência para uma unidade militar. “Ninguém jamais acreditou nessa falácia. Mas, naquele momento, a família ainda tinha esperanças de encontrá-lo vivo. Preso e possivelmente submetido à tortura, mas vivo.”
Somente 15 anos depois surgiram as primeiras revelações sobre o real destino de Paiva, brutalmente assassinado sob a guarda do Estado. Em 1986, o tenente-médico do Exército Amílcar Lobo confirmou à Polícia Federal ter atendido o ex-deputado às vésperas de sua morte. Em seu relato, ele enfatiza que o preso chegou aos seus cuidados em situação deplorável, “na condição de abdome em tábua, o que em linguagem médica pode caracterizar uma hemorragia abdominal”.
Outro telegrama, datado de 30 de setembro de 1969, confirma a prisão de Virgílio Gomes da Silva por agentes da Operação Bandeirante (Oban). Segundo o texto, produzido pelo consulado dos EUA em São Paulo, o militante da Ação Libertadora Nacional “morreu enquanto estava sendo questionado”. A correspondência ressalta que “possivelmente a polícia vai não dar conhecimento público de que ele foi preso”.
Silva havia sido assassinado no dia anterior, aos 36 anos, após ser preso em uma emboscada na Avenida Duque de Caxias, na capital paulista. Encapuzado, foi encaminhado diretamente à sala de tortura, de onde sairia morto após 12 horas de suplício, concluiu a Comissão Nacional da Verdade. Vários presos políticos presenciaram os maus-tratos sofridos por ele e as denunciaram em auditorias militares. Apesar das significativas evidências que atestam as circunstâncias de sua morte, os órgãos de segurança até hoje não se posicionaram de forma clara sobre o caso.
Um relatório do Ministério do Exército, emitido pelo CIE em outubro de 1969, afirma que Silva teria se “evadido” após a prisão. O Serviço Nacional de Informação de São Paulo emitiu outro documento, em 3 de outubro de 1969, afirmando que o “terrorista” Virgílio Gomes da Silva, vulgo “Jonas”, teria falecido após resistir à prisão. Já o Relatório dos Ministérios Militares, emitido em 1993, o aponta como “desaparecido”.
Os EUA também tinham conhecimento da farsa montada pelos militares no atentado do Riocentro, em 1981. “De nosso ponto de vista, não há dúvida de que tanto o sargento Guilherme Pereira do Rosário, morto, e o capitão Wilson Luís Chaves Machado, gravemente ferido, eram os pretensos autores e não as vítimas de um ataque à bomba”, diz um relatório, preparado para o Departamento de Defesa.  “Parece claro que os dois indivíduos, como membros do DOI-Codi, agiam sob ordens oficiais no momento em que a bomba acidentalmente explodiu no carro deles.”
Os norte-americanos nem sequer cogitaram aceitar a versão oficial: “Porta-vozes militares de alta patente anunciam continuamente que os socialistas/comunistas tentam comprometer a abertura política e frustrar os esforços do presidente para desenvolver uma democracia. Isso tem sido repetido tantas vezes que alguns estão começando a acreditar, mesmo que não haja nenhuma evidência para apoiar a acusação”.
Os documentos desclassificados comprovam que os Estados Unidos jamais deixaram de monitorar a situação no Brasil, e sua influência não ficou restrita ao golpe de 1964, avalia Dias: “A violência praticada pelo Estado foi percebida pelos norte-americanos. E eles sabiam que não eram casos isolados perpetrados por alguns ‘desajustados’ dentro do sistema repressivo montado. Por mais que recriminassem os excessos da ditadura, pareciam satisfeitos com o papel desempenhado pelo Brasil na contenção aos movimentos de esquerda, dentro e fora das fronteiras”. 
 
Fonte: Carta Capital.

Os Anos JK: uma trajetória política


Filme que apresenta o panorama político no brasil entre 1945 e 1964. Importantíssimo para se compreender que o discurso contra a corrupção sempre foi usado para indignar a sociedade, desviando o foco dos reais problemas do país.

terça-feira, 4 de agosto de 2015

MPB nos Tempos da Ditadura



O Programa Ensaio preparou em 2004 uma edição especial denominada ” A MPB dos Tempos da Repressão”, que reunia grandes personalidades da Música Popular Brasileira, que estiveram fortemente ligadas à luta contra a ditadura militar instaurada no Brasil.

MPB: A história que o Brasil não conhece


Baseado em um livro polêmico que conta que a partir dos anos 40, a música brasileira começou a impressionar o mundo pelo seu potencial. Os sucessos de Ari Barroso, Carmem Miranda e Tom Jobim deixaram as corporações artísticas espantadas e com medo do Brasil dominar o mundo. A partir daí, foi criada uma corporação secreta com um único objetivo: destruir a música brasileira.

O que sou nunca escondi (2009) - Um filme sobre Geraldo Vandré