terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Afinal, para que serve a História?

No seu primeiro dia de aula, provavelmente na segunda fase do ensino fundamental, um professor de História entrou em sala para discutir a importância do estudo dessa matéria. Tal discussão, sem dúvida, é importante. Afinal, as questões e modos de se investigar o passado nessa nova fase do ensino passam a ser mais complexas e você, enquanto indivíduo em formação, já se mostra tentado a levantar algumas questões mais profundas sobre o que aconteceu no passado.

Sabemos que muitos por aí aprenderam que a História é importante para que não cometamos os mesmos erros do passado, para que tenhamos a oportunidade de organizar o agora e o porvir de modo mais seguro. Sob tal perspectiva, o estudo dos fatos consumados teria um valor estratégico. Em outras palavras, essa ideia sugere que a análise e a crítica do passado determinam o alcance de um futuro livre das mazelas que um dia nos afligiu.

De fato, ao observar esse tipo de uso para o passado, somos tentados a romantizar a História como ferramenta indispensável ao progresso. Contudo, seria mesmo correto dizer que a compreensão do passado garante verdadeiramente uma sociedade ou uma civilização mais aprimorada? Se assim fosse, toda a mazela que a Primeira Guerra Mundial trouxe para a Europa incutiria a “lição” de que uma Segunda Guerra Mundial não deveria acontecer. Mas não foi bem assim que as coisas se deram, não é?

Percebendo esse tipo de incoerência é que temos a chance de intuir que a História não tem essa missão salvadora de alertar ao homem sobre os erros que ele não pode cometer novamente. Na verdade, antes de acreditar que as sociedades e civilizações já cometeram um mesmo equívoco duas vezes, devemos entender que esses homens que são objetos de estudo do passado não pensam, sentem, acreditam ou sonham da mesma forma através dos dias, anos, décadas, séculos e milênios.

Sendo assim, a noção de progresso atribuída à História deve ser abandonada em favor de uma investigação dos valores, das relações sociais, conflitos e outros vestígios que nos mostram a transitoriedade e a mutação dos contextos em que os fatos históricos são consumados. É desse justo modo que passamos a entender que o homem e as sociedades que lutaram e sofreram na Primeira Guerra Mundial não são exatamente os mesmos que surgiram no cenário da Segunda Guerra Mundial.

Feita essa reflexão, não devemos chegar ao ponto de pensar que os contextos e períodos em que a História decorre são radicalmente distintos entre si. De uma época para outra, podemos notar que as sociedades não abandonam seu antigo modo de agir para incorporar uma postura completamente inovadora. Em cada período é necessário reconhecer as continuidades e descontinuidades que mostram a força que o passado possuiu enquanto referencial importante na formação dos indivíduos e das coletividades.
Ao realizar esses apontamentos, não devemos acreditar que o passado não passa de um jogo caótico controlado por jogadores (no caso, os homens) que não sabem definir suas próprias regras. Antes disso, é muito mais interessante notar que esse jogo tem feições múltiplas e que as formas de reconhecer a natureza de suas regras podem se transformar de acordo com a forma que olhamos para o passado.

Sendo assim, a investigação do passado se transforma em um grande debate em que cada interessado tem a oportunidade de mostrar uma riqueza inédita sobre um mesmo tema. Na medida em que isso acontece, não só temos a chance de pensar sobre aquilo que o homem já fez, mas também temos uma maneira curiosa, mesmo que seja pela completa diferença, de debater os nossos valores e questionar o agora com os “olhos” de nossos antepassados.

Por Rainer Sousa
Mestre em História
Equipe Brasil Escola

Fonte: Blog Aula de História Virtual

3 comentários:

  1. É claro que o Homem que passou pela Primeira Guerra Mundial não é o mesmo Homem pelo qual passou pela segunda. O que importa, além de conhecermos o passado para não repetí-lo em suas mazelas, é aprender com ele, interiorizar o que ele nos mostrou por nossas próprias experiências. Além do mais, saber História e poder ter em mãos ferramentas que sempre foram excluídas da maioria da população é importantíssimo, ainda mais em um país como o Brasil em que as pessoas leem um pouco mais de um livro por ano (1,4) e com certeza esse livro não é de História (a classe História fica entre 9º e 10º lugar no gosto dos leitores), perdendo até mesmo para livros de autoajuda, como os livros de Paulo Coelho. Então, acredito que antes da pergunta: Afinal, PARA QUÊ serve a História? Deveríamos nos perguntar COMO a História e a sua leitura está sendo estimulada nos alunos hoje em dia?

    ResponderExcluir
  2. Interessante esta tua observação. Partindo da perspectiva que a leitura (seja da decodificação de códigos, passando pela interpretação de imagens e sons) é fundamental para a compreensão> A análise da História e seus processos só é possível com a leitura, por isso que realmente é muito importante esta duvida sobre qual a maneira a História e a sua leitura estão sendo estimuladas no ambitente escolar e na sociedade.

    ResponderExcluir
  3. Afinal, para que serve a História? Quando vejo essa indagação me vem logo a mente a indagação que um garoto fez no inicio do Livro "Apologia da História ou Ofício de Historiador" de Marc Bloch.

    Não temos uma resposta simples e imediata. Por isso seu texto é muito bem construído. Pois a serventia da história não está num olhar Linar e nem progressista. Dizer que o passado pode nos mostar um futuro melhor serveria bem para um romance, mas talvez não caberia a História. Pois como você mesmo colocou: Se isso fosse verdade depois da 1º guerra não teriamos a 2º guerra mundial. Pq cada tempo é um tempo na história. Ou como diria os historiadores a "História e filha de seu Tempo"

    Abraços.

    ResponderExcluir