Documentário sobre a participação dos EUA no golpe de 1964 reúne documentos oficiais ainda inéditos no Brasil, como gravações com o presidente Kennedy
Alice Melo
A participação dos Estados Unidos no golpe militar de 1964 nunca ficou tão evidente em um produto audiovisual brasileiro voltado para a televisão. Baseado em documentos oficiais da CIA e da Casa Branca - mantidos como “Top Secret” durante quatro décadas -, o documentário “O dia que durou 21 anos”, de Camilo Tavares, apresenta os bastidores do envolvimento do governo norte-americano no afastamento de João Goulart da Presidência da República e a escolha do general Castelo Branco como novo líder da nação.
A série, que será exibida pela TV Brasil em três episódios de 26 minutos nos dias 4, 5 e 6 de abril, às 22h, mostra que os americanos até cogitaram a possibilidade de apoiar militarmente a “revolução”.
“São imagens reveladoras, contundentes. Um corte histórico para os dias de hoje, narrado de forma bem didática para o público geral”, diz Rogério Brandão, superintendente de programação do canal.
O documentário reúne depoimentos de pessoas que participaram do golpe militar - tanto a favor quanto contra ele; testemunhos de gente ligada à Embaixada dos EUA na época; e declarações de acadêmicos brasileiros e norte-americanos que estudam o tema.
A obra levou cerca de dois anos para ficar pronta e, no segundo semestre, deve chegar às salas de cinema como longa-metragem. “Mais cenas serão incluídas. Teremos novos depoimentos e vamos expandir o tema”, diz Camilo Tavares. Segundo ele, filme dará margem para se abordar também o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969, deixado de lado no formato para a TV. No controverso episódio, um grupo de jovens contrários ao regime manteve o embaixador em cativeiro em troca da liberdade de presos políticos. O pai de Camilo, o jornalista Flávio Tavares, participou da ação e seguiu para o exílio logo depois.
“Antes, queria fazer um filme mais pessoal e falar um pouco da história do meu pai”, lembra o diretor. Ele explica que novos rumos foram tomados no meio do caminho: “Depois que achamos os documentos, decidi mudar todo o roteiro. Aquele material era muito rico.”
Segundo ele, o surgimento de documentos recém descartados pela CIA e Casa Branca que comprovavam a participação do governo norte-americano na instauração da ditadura no Brasil atrasou o lançamento do filme. Entre as fontes inéditas por aqui estão as gravações de conversas telefônicas entre o embaixador Lincoln Gordon e os presidentes John Kennedy e Lyndon Johson; telegramas oficiais trocados entre ambas as partes citadas, além de arquivos de vídeo da época, retirados de entrevistas de emissoras de TV norte-americanas.
O acesso a estas fontes é permitido devido à política de arquivos do EUA, que prevê a abertura de documentos do governo 40 anos após permanecer sob sigilo.
As gravações mostram que a trama para o afastamento de Goulart da presidência começou em 1962, quando o governo norte-americano teria passado a financiar campanhas no Brasil contra o chefe-de-estado. Enquanto o mundo vivia à ameaça de uma Terceira Guerra Mundial, os Estados Unidos temiam “perder” o Brasil para o lado comunista da disputa: se o Brasil entrasse por este caminho, iriam com ele todos os países da América Latina. Segundo os telegramas, Washington não queria deixar que acontecesse no Brasil o que acontecera com Cuba, em 1959.
Fonte: RHBN
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